Tenho de o afirmar:
A verdade é que a própria proximidade daquela mulher me incomodava, ao ponto de eu quase não conseguir olhar para ela.
Ela sentia o poder que tinha e divertia-se com isso, deleitava-se, alimentava-se disso.
O concerto foi decorrendo, o som alto demais para me aperceber de conversas que pudesse haver entre elas e as outras pessoas que estavam ao pé de mim e que as conheciam. O meu incómodo e fascínio por ela não desvaneciam. Até que…
Houve uma altura em que os nossos olhares se cruzaram e ficaram. E foi ai que eu percebi. E o fascínio, de repente, desvaneceu-se. Ela não era, afinal, nenhum avatar, nenhuma deusa encarnada. Era uma casca, uma aparência, alguém que tinha investido tanto no que parecia que descurar tudo o resto. Para lá da aparência, do aspecto, do charme, havia algo que falhava, embora, se me perguntassem, eu não conseguisse dizer o quê.
Mas, fosse o que fosse, tinha-se quebrado o encanto e, aos meus olhos ela saiu do pedestal e passou a ser apenas mais uma mulher no meio de tantas outras que por ali havia. E o engraçado é que ela notou essa mudança em mim e reparei o quanto, subtilmente, isso lhe abalou a confiança. E daquele momento em diante deixei de me sentir incomodado pela presença dela, deixei de não conseguir tirar os olhos dela, e voltei a ser eu próprio, sem fascínios nem deslumbramentos.
A amiga, o anjo louro que a acompanhava, notou também qualquer coisa de diferente após o nosso cruzar de olhares e pareceu intrigada.
A noite continuou, comigo a ir travando conhecimento com as pessoas mais próximas, no que fui ajudado pelo intervalo no concerto em que os artistas desceram do palco e, enquanto o vocalista e o baixista foram ter com pessoas do outro lado da mesa, o resto veio para o pé de mim. Uma vez que não havia lugares sentados para todos, levantei-me e ficamos ali, na conversa, com piadas de músico que mais ninguém entende, e às vezes nem os próprios músicos, num momento de pura descompressão, para eles, e descontracção para mim.
Quando eles voltaram para o palco, ao sentar-me, olhei para os olhos do anjo, e ai sim, descobri algo de raro e precioso. A personalidade doce passava num olhar límpido, e no entanto, bem lá no fundo, por baixo daqueles lagos azuis queimava um fogo que lutava por se libertar. Tinha algo de intangível e que, suspeitava eu, se mantinha contido pela contínua presença da amiga. Ela, embora fosse lindíssima, sentia-se sempre o patinho feio. Mas hoje não era. Para mim não era. E ela percebeu. E sorriu. E eu também…
A verdade é que a própria proximidade daquela mulher me incomodava, ao ponto de eu quase não conseguir olhar para ela.
Ela sentia o poder que tinha e divertia-se com isso, deleitava-se, alimentava-se disso.
O concerto foi decorrendo, o som alto demais para me aperceber de conversas que pudesse haver entre elas e as outras pessoas que estavam ao pé de mim e que as conheciam. O meu incómodo e fascínio por ela não desvaneciam. Até que…
Houve uma altura em que os nossos olhares se cruzaram e ficaram. E foi ai que eu percebi. E o fascínio, de repente, desvaneceu-se. Ela não era, afinal, nenhum avatar, nenhuma deusa encarnada. Era uma casca, uma aparência, alguém que tinha investido tanto no que parecia que descurar tudo o resto. Para lá da aparência, do aspecto, do charme, havia algo que falhava, embora, se me perguntassem, eu não conseguisse dizer o quê.
Mas, fosse o que fosse, tinha-se quebrado o encanto e, aos meus olhos ela saiu do pedestal e passou a ser apenas mais uma mulher no meio de tantas outras que por ali havia. E o engraçado é que ela notou essa mudança em mim e reparei o quanto, subtilmente, isso lhe abalou a confiança. E daquele momento em diante deixei de me sentir incomodado pela presença dela, deixei de não conseguir tirar os olhos dela, e voltei a ser eu próprio, sem fascínios nem deslumbramentos.
A amiga, o anjo louro que a acompanhava, notou também qualquer coisa de diferente após o nosso cruzar de olhares e pareceu intrigada.
A noite continuou, comigo a ir travando conhecimento com as pessoas mais próximas, no que fui ajudado pelo intervalo no concerto em que os artistas desceram do palco e, enquanto o vocalista e o baixista foram ter com pessoas do outro lado da mesa, o resto veio para o pé de mim. Uma vez que não havia lugares sentados para todos, levantei-me e ficamos ali, na conversa, com piadas de músico que mais ninguém entende, e às vezes nem os próprios músicos, num momento de pura descompressão, para eles, e descontracção para mim.
Quando eles voltaram para o palco, ao sentar-me, olhei para os olhos do anjo, e ai sim, descobri algo de raro e precioso. A personalidade doce passava num olhar límpido, e no entanto, bem lá no fundo, por baixo daqueles lagos azuis queimava um fogo que lutava por se libertar. Tinha algo de intangível e que, suspeitava eu, se mantinha contido pela contínua presença da amiga. Ela, embora fosse lindíssima, sentia-se sempre o patinho feio. Mas hoje não era. Para mim não era. E ela percebeu. E sorriu. E eu também…
11 comentários:
Gostei o desenrolar de acontecimentos.
Julgo que por vezes o inverso também acontece: o supor-se que uma mulher bela e chamativa não passa de uma casca sem sequer haver a preocupação de "ler" o olhar...
Adoro teu canto....dá vontade de mais e mais..
Beijos
Louise,
Não podes ter uma ideia de alguém até lhe leres o olhar. Presumir seja o que for seja acerca de quem for sem ter uma ideia do que vai na alma é enganoso...
E muitos erros podem ser evitados com tão pouco...
:)
Eu sou neguinha,
Obrigado, mesmo.
:)
Olhar a alma do outro é algo que por vezes deixamos passar despercebidos, enpriagados por uma casca que se apresenta a nós. Conseguir vislumbrar o interior do outro e de lá tirar toda a beleza que transcende a parte fisica...isso é mágico, porém acontece na nossa realidade e nos encanta.
Mais uma vez amei o conto...
Beijos
{cristal}_DARIUS,
...há mais...
Obrigado!
:)
A minha intuição... não me enganou.
Há sempre muito mais, quando se presta um pouco de atenção...descobre-se para além do óbvio, ou ilusório.
Aguardo o desfecho...
:)
É triste quando alguém se "anula" devido a um outro alguém. No entanto, é muito bom saber que ainda há pessoas que conseguem ver para além do que está à vista ;)
Libertya,
Quando se presta atenção, por vezes vê-se mais...
...e outras menos do que se esperava!
Isto, claro, quando criamos espectativas...
:)
Há muito quem se anule voluntariamente...
Mas eu, pessoalmente, como tenho a noção de que uma pessoa é muito mais do que um monte de compostos orgânicos arranjados de uma determinada forma, tento sempre ver para lá do óbvio, antes de formar uma opinião.
Não é que seja sempre fácil. Às vezes o óbvio tende e infiltrar-se pelos nossos olhos adentro e ofusca o resto, mas quando isso acontece só convém estar mesmo mais atento...
Como diria Carl Sagan, no fim das contas somos todos feitos de pó de estrela...
:)
Por norma criamos sempre alguma, mas há quem se dê ao trabalho de prestar um pouco mais de atenção e tente não se cingir à embalagem, mas sim ao seu conteudo, assim como tu... e eu.
There's more to it than what beats the eye...
:)
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