Sobressaltou-se, olhou para a porta e olhou para ele, que continuava a exibir uma calma e um controle fora do comum, calma essa que a confundia. Era obvio que ele, enquanto ela se despia, apreciava cada movimento, cada centímetro do seu corpo, e no entanto não havia nele qualquer reacção que não fosse de puro cavalheirismo.
E agora, neste momento, limitou-se a levantar-se e caminhou em direcção a ela e à porta. Ao chegar ao pé dela limitou-se a dizer com um sorriso:
-Não se preocupe, é apenas a minha mulher.
Ela ficou sim pingo de sangue.
-O quê? – perguntou enquanto se baixava rapidamente para apanhar a camisa para se cobrir.
-A sério, não se preocupe. – voltou a afirmar enquanto se virava para abrir a porta não lhe dando tempo para vestir a camisa. Ela limitou-se a pô-la atabalhoadamente à sua frente, cobrindo o peito enquanto ele abria a porta e deixava entrar uma mulher.
A mulher era loura, com o cabelo comprido a cair numa cascata de caracóis largos até quase à cintura, pequena e magra, com uma pele branca que lhe dava um ar de boneca de porcelana, um ar frágil e tímido. O rosto era lindíssimo, como se tivesse sido finamente desenhado, com uns lábios carnudos realçados por um batom de um encarnado vivo que fazia parecer que todo o seu sangue se concentrava ali. A maquilhagem suave que usava era perfeita para realçar os olhos verde jade, lindos e intensos, mas que espelhavam toda a timidez dela.
Vestia uma gabardine comprida que a tapava por completo até bem abaixo do joelho, com um cito que a ajustava à sua silhueta, o que deixava adivinhar que seria magra mas não deixava adivinhar as suas formas.
Trazia consigo uma caixa embrulhada.
Deram os dois um suave beijo nos lábios, ele fechou a porta e voltou a sentar-se no sofá. A mulher voltou-se finalmente para ela.
-Olá, eu sou a Rute. – disse numa voz quase apagada.
-Olá. Eu sou a Ana. – respondeu ela sem fazer a mínima ideia de como reagir à situação.
A mulher apresentou-lhe a caixa embrulhada.
-É uma prenda para si.
Ela agarrou a caixa com uma mão, mantendo a outra a agarrar a camisa que a cobria.
-Obrigada.
-Não quer abrir?
Ela assentiu. Dirigiu-se até ao sofá que estava desocupado e sentou-se, sempre sem largar a camisa, pousou a caixa na mesa, ao lado dos copos de vinho e abriu o embrulho apenas com a mão livre. A caixa no interior era de uma conhecida marca de langerie.
-Só pude tentar adivinhar o seu tamanho pela conversa que teve com o meu marido. Espero que lhe sirva…
Ana abriu a caixa e lá dentro estava uma deslumbrante combinação de cetim branco.
-É linda. Obrigado.
-Não a quer experimentar? – Perguntou a Rute.
Ana corou. Olhou para o homem de quem nem sabia ainda o nome que acenou afirmativamente com um sorriso calmo.
Respirou fundo, levantou-se, largou finalmente a camisa, expondo-se aos olhos dos dois, tirou a combinação da caixa e apreciou-a. Depois, pôs-se de pé e dirigiu-se ao espelho, vestindo-a e observando-se. A medida era perfeita e a peça pereceu moldar-se ao seu corpo. Sentiu-se deslumbrante e pôde ver o ar de aprovação de ambos os elementos do casal.
-Acho que estou bem, não estou?
-Está linda. - Afirmou Rute.
-Mas sinto-me… deslocada.
-Porquê?
-Sou a única pessoa aqui nestes preparos…
Rute aproximou-se dela.
-Compreendo.
Desapertou o cinto que lhe cingia a gabardine, desabotoou-a e abriu-a revelando que por baixo da mesma havia apenas um corpete com ligas encarnado bem escuro, aveludado, que lhe segurava as meias de seda, e um fio dental que fazia conjunto. As peças adornavam um corpo absolutamente pecaminoso, antes insuspeito por baixo da gabardine.
-Ainda se sente deslocada? – Perguntou Rute fixando-a nos olhos.
-Não, já não. Não me leva a mal se eu lhe disser que é uma mulher deslumbrante?
-Nada, mas olhe que a Ana não fica atrás…
-Ora. Não será assim tanto…
-Acha que não? Basta ver a expressão do meu marido…
Rute aproximou-se de Ana pondo-se ao seu lado e envolvendo-a pela cintura, ficando as duas voltadas para ele, ambas um puro contraste uma da outra, mas ambas deslumbrantes.
-Vê? – Perguntou Rute. – O olhar dele não nos larga.
Ana sorriu. Sentia-se absolutamente deliciada com a atenção que recebia, sentia-se plena e mulher, sensual e apreciava o momento. Sorriu ao homem e olhou para Rute, que tinha o olhar fixo em si, ficando com o olhar preso no dela.
Rute aproximou-se de Ana, chegando com o seu rosto bem perto do dela, e Ana, ao vê-la aproximar sentiu em si uma hesitação e vacilou. Rute deixou os seus lábios bem próximos dos dela, esperou um pouco para ver se a indecisão se desvanecia e acabou por sussurrar apenas… - Confia - …e com isto foi como se algo levantasse entre elas e os lábios de ambas colaram-se num beijo…
(continua)